O conservadorismo, em uma de suas ideias fundamentais, prevê a conservação das tradições e costumes de um determinado povo, mas no Brasil há um fenômeno deveras curioso de grande parte da nossa direita conservadora: ela odeia as raízes do Brasil. A nossa direita despreza nossas raízes ibero-católicas e se apega a estrangeirismos para moldar uma nova cultura, algo em certo sentido, revolucionário, se pensarmos na noção de que o revolucionário é aquele que busca moldar a sociedade de cima para baixo de acordo com uma determinada tese e leva-la a práxis (ação dialética entre teoria e prática). Aliás, o que o Brasil mais teve nos últimos cento e cinquenta anos, foram movimentos, partidos e políticos propriamente ditos, que odeiam as nossas tradições. Nossa república, instaurada mediante a um golpe, é um exemplo crasso de tal ódio. Quando os republicanos, impopulares, conduziram o golpe que depôs o Imperador Dom Pedro II, a ideia era tornar o Brasil um simulacro da revolucionária República da França e dos Estados Unidos. O primeiro nome de nossa república era Estados Unidos do Brasil, nossa primeira bandeira era uma cópia da bandeira americana em verde e amarelo, nosso primeiro hino foi La Marseillaise. Ora, isso era algo estranho ao nosso povo, pois, os fundamentos éticos, morais e civilizacionais do Brasil nada tinha a ver com aqueles ideais.
A direita liberal-conservadora imita aqueles que golpearam o Império, pois, desejam, como eles, que os traços antropológicos do povo brasileiro sejam rompidos para que nos tornemos uma cópia, como propunham os golpistas republicanos, dos Estados Unidos, assim como, do pensamento anglo-saxão como um todo, enquanto modelo de sociedade. Então se ignora os aspectos próprios do povo brasileiro, como o conceito formulado por Sérgio Buarque de Holanda, do Homem Cordial – termo que Buarque de Holanda usa em sua origem etimológica cordis, em latim, que significa “coração” – ou seja, o brasileiro não é o sujeito racionalista, praticista e pragmatista, como os liberais-conservadores anglo-saxões, que tem uma visão meramente prática e utilitarista das coisas, o brasileiro, como no conceito de Homem Cordial, prioriza muito mais as relações humanas do que o formalismo e utilitarismo inglês. Apesar de certos vícios, essas raízes antropológicas do Brasil formaram uma nação, uma nação que, em centenas de características, uma das mais significativas é a harmonia.
O Brasil, por ser miscigenado, formado pelas mesclas entre católicos-ibéricos, índios e negros, não passou por constantes conflitos internos entre o próprio povo: não vemos profundas rupturas do tecido social como nas nações anglo-saxônicas; não fomos construídos pelo racismo desenfreado que oprimia e segregava parte do povo; não nos construímos pela noção de alguns grupos protestantes de que parte de seu povo eram uma “sub-raça”, eram “inferiores”, eram “menos humanos”, como pensavam esses grupos no que tange os negros e os índios norte-americanos. A nossa unidade católica não nos deixou que seguíssemos os rumos do divisionismo e ódio radical dos povos anglo-saxões. No Brasil, que nossa direita não gosta, temos, como já citado, ao contrário dos americanos e ingleses, uma sociedade harmônica, apesar das diferenças étnicas. Gilberto Freyre, na obra Casa Grande & Senzala, descreve muito bem a referida harmonia:
“Híbrida desde o início, a sociedade brasileira é de todas da América a que se constituiu mais harmoniosamente quanto às relações de raça: dentro de um ambiente de quase reciprocidade cultural que resultou no máximo de aproveitamento dos valores e experiências dos povos atrasados pelo adiantado; no máximo de contemporização da cultura adventícia com a nativa, da do conquistador com a do conquistado”.
O fascínio da direita liberal-conservadora pelo modelo de sociedade liberal inglesa e americana não se justifica quando observamos que, apesar da prosperidade econômica, há ali uma sociedade profundamente divisiva e odiosa entre os seus comuns.
O liberal-conservador brasileiro é, na verdade, um sujeito revolucionário, ele não se difere nem um pouco de um Diderot, ou um Voltaire, que detinham um ódio descomunal pela herança do medievo e da Igreja Católica, por isso, buscavam mudar a sociedade de cima para baixo por um ideal imaginário de uma sociedade racionalista.
Precisamos de uma direita que visa preservar as raízes fundantes do Brasil e que olhe para as nossas tradições e costumes que são parte da nossa cultura. Precisamos de uma direita não-revolucionária. Já temos uma esquerda que odeia nossa história, odeia tudo aquilo que fundou nosso país e busca transforma-lo de cima para baixo. Temos uma esquerda que, assim como à direita, usa de estrangeirismos, os tais Black Lives Matters, e outros grupelhos que possuem motivações estranhas a formação do Brasil enquanto sociedade, como meios para as suas ações políticas. Não precisamos de uma direita que faz o mesmo.