A violência urbana no Brasil é um problema crônico causado por indivíduos, organizações criminosas e pela corrupção, que, por sua vez, vem crescendo ao longo da década, atingindo diretamente ou indiretamente à população, colocando em risco a vida de milhares de cidadãos. Ela é geradora de um mal-estar coletivo, da desordem das instituições públicas e da insegurança.
O Sistema de Vigilância de Violências e Acidentes (VIVA), através de uma pesquisa realizada em 2010, mostra que os homens jovens, de 20 a 29 anos com escolaridade média de 5 a 8 anos, são 71,1% das vítimas de violência urbana em relação às mulheres.
A Organização das Nações Unidas (ONU), na última estimativa realizada (2014), considerou o Brasil o 16º lugar mais violento do mundo, tendo em vista os 437 mil assassinatos ocorridos no mundo no ano anterior (2013), cerca de 10% foram registrados em território brasileiro.
Esses assassinatos, por sua vez, estão ligados à furtos, roubos, violência doméstica, narcotráfico, entre outros.
No que tange ao registro de furtos e roubos, o Brasil tem a terceira maior taxa de roubos da América Latina. Já na violência doméstica, infelizmente a ocorrência ainda é frequente, pois, estimativas apontam que 18 mil crianças por dia, uma mulher a cada 15 segundos e um idoso a cada 10 minutos sejam vítimas de algum tipo de violência no país.
No narcotráfico, o Brasil é o 2° maior consumidor mundial de cocaína e derivados do mundo, segundo o Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (Lenad), fato que contribui para o aumento da violência.
Ainda, o Atlas da Violência 2017, estudo desenvolvido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostra que em 2015 ocorreram 59.080 homicídios, uma taxa de 28,9% por 100 mil habitantes.
Eu, por exemplo, já presenciei a violência e pensei que seria assassinado muitas vezes, pois, fui vítima de assalto por 10 (dez) vezes em minha cidade natal, no Estado de Minas Gerais. É uma sensação horrível e traumatizante.
A violência pode, no entanto, provocar severas consequências em longo prazo como doenças mentais, obesidade e câncer por exemplo.
Segundo o relatório sobre a situação mundial da prevenção da violência 2014, elaborado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), com dados fornecidos por 133 países, além das consequências imediatas (ferimentos, maus-tratos, dias perdidos de trabalho ou escola), a violência contribui para que a má saúde se prolongue durante toda a vida, principalmente no desenvolvimento de transtornos do sono ou da alimentação (anorexia, obesidade), depressão, ansiedade, gravidezes involuntárias e diabetes.
Embora as estatísticas, o governo brasileiro tem se esforçado para melhorar os índices. Todavia, o Brasil teve uma queda de 22% no número de mortes violentas registradas nos nove primeiros meses deste ano em comparação com o mesmo período de 2018, apresentando resultados expressivos nos Estados do Acre, Ceará e Rio Grande do Norte, conforme o índice nacional de homicídios criado pelo G1, portal ligado ao grupo Globo.
Mas, apesar do avanço, os resultados ainda não são animadores e, por essa razão, o Ministro da Justiça e da Segurança Pública Sérgio Moro propôs um pacote denominado como “anticrime”, a fim de trazer medidas mais duras para combater o crime organizado, isolar lideranças criminosas e intensificar o combate à impunidade para trazer mais segurança para população.
Esse pacote foi aprovado, sendo, por conseguinte, sancionado pelo Presidente Jair Bolsonaro e publicado no Diário Oficial da União (DOU) em 24 de Dezembro de 2019 com vetos e entrará em vigor em 23 de Janeiro de 2020 e prevê alterações e inclusões no Código Penal, no Código de Processo Penal e na Lei de Execução Penal no que concerne a prisão em segunda instância, embargos de declaração e recursos, no crime de caixa dois nas eleições, endurecimento das penas e solturas, saídas temporárias e progressão de pena, bem como também na legítima defesa.
Além disso, está prevista mudanças no entendimento sobre organizações criminosas, armas de fogo, confisco de bens de origem criminosa, acordos com investigados, presídios federais, agentes disfarçados, a criação do Banco Nacional de Perfis Balísticos e do Banco Nacional Multibiométrico e de Impressões digitais.
Um dos pontos importantes, é no tocante à prisão em segunda instância, que atualmente não há regulamentação, apenas entendimentos dos tribunais. Após entrar em vigor a nova lei, a execução da condenação deverá acontecer imediatamente após julgamento em segunda instância.
Já nos embargos de declaração e recursos, a mudança definirá que a prescrição não correrá na pendência de embargos de declaração ou de recursos aos Tribunais Superiores, estes quando inadmissíveis.
Nos crimes de caixa dois em eleições, a nova lei definirá pena de 2 a 5 anos para quem utilizar recursos paralelos à contabilidade exigida pela legislação eleitoral; agentes públicos envolvidos terão pena aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços).
No que diz respeito ao endurecimento das penas e solturas, a atual lei vigente prevê pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto, assim como determina escolhas que o juiz pode fazer no caso de prisão em flagrante (como torná-la preventiva ou conceder liberdade provisória).
Na Progressão de penas e saídas temporárias, haverá alterações na lei 8.072/90 (Lei de crimes hediondos). Na atual legislação, a progressão de regime pode acontecer após o cumprimento de 2/5 (dois terços) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente. Com a alteração, a progressão acontecerá apenas após o cumprimento de 3/5 da pena quando envolver morte da vítima; maior rigor com as liberações de saídas temporárias tanto para quem cumpre regime fechado quanto para o semiaberto.
Os artigos que regulamentam a legítima defesa também sofrerão mudanças. Todavia, a lei atual determina que qualquer pessoa não será criminalizada por cumprimento de dever legal, e que responderá pelo excesso doloso ou culposo. Na nova lei faculta ao juiz reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la se o excesso acontecer devido à comprovada situação de medo, surpresa ou violenta emoção; inclui duas situações em que o ato do agente policial será considerado em legítima defesa – quando prevenir agressão à vítima mantida refém, ou a ele ou a outra pessoa em conflito armado.
É importante ressaltar também sobre as alterações no conceito de organizações criminosas. A legislação vigente define conceito para associação criminosa de forma genérica (associação de 4 ou mais pessoas com divisão de tarefas para cometer infrações). Já na nova lei inclui no conceito de organização criminosa aquela que se valha da violência, por exemplo, para obter o controle sobre a atividade criminal (citando Primeiro Comando da Capital, Comando Vermelho, Família do Norte, entre outros).
No que concerne ao uso de armas de fogo, a nova lei aumenta as penas de crimes praticados por pessoas com registros criminais pretéritos, com condenação definitiva ou proferida por Tribunal. Na atual legislação, o Estatuto do Desarmamento apenas estipula as normas para registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição. Além disso, é importante frisar sobre os agentes disfarçados, em que preverá a participação desse tipo de agente em ações envolvendo crimes de lavagem de dinheiro, venda ilegal de drogas e de armas.
Já no confisco de bens de origem criminosa, o Juiz poderá autorizar o uso, por órgãos públicos, de bens apreendidos de origem criminosa (por exemplo, veículo, barco ou aeronave) e, no que tange aos acordos com investigados, haverá a possibilidade de negociar acordos com investigado que confesse crime, sem violência ou grave ameaça, e com pena máxima inferior a quatro anos.
Nos Presídios Federais, a atual lei determina regras sobre a atividade jurisdicional dos estabelecimentos federais, como o período de permanência de até 1 ano, renovável. Com a alteração, todo presídio federal tenha recolhimento em celas individuais, visitas em dias determinados sem contato direto (separados por vidro), entre outras regras; período de permanência passa a ser de até 3 anos.
Ainda, haverá também a criação do Banco Nacional de Perfis Balísticos, que que será gerido nas unidades de perícia da União, estaduais e distrital e do Banco Nacional Multibiométrico e de Impressões Digitais, que visa trazer informações de presos provisórios ou definitivos para subsidiar investigações criminais federais, estaduais ou distrital.
Alguns especialistas afirmam que essa medida viola direitos e garantias fundamentais e, portanto, é descabida e disfuncional, uma vez que promete algo que não conseguirá se realizar.
Entretanto, tal afirmativa está em desencontro com a realidade, pois, a própria Constituição Federal prevê como direitos e garantias fundamentais para os presos a proibição de penas cruéis e perpétuas, bem como o respeito à integridade física e moral, o que não foi violado.
Contudo, esse pacote é, sem dúvidas, uma grande evolução no combate ao crime, visando trazer alívio e segurança a todos os cidadãos de bem que trabalham e seguem suas vidas de maneira ordeira e pacífica.
Em resumo, pode-se arguir que essa nova lei será, brevemente, um dos antídotos para cura do caos social, eis que trará mecanismos mais eficazes de repressão ao crime e a ressocialização do criminoso.