No Brasil do século XXI, pode-se vislumbrar a ascensão de alguns movimentos políticos de direita ou de extrema-direita, a qual se intitularam como conservadores, cujas finalidades, a princípio, seriam a defesa da família, da liberdade, do Estado Democrático de Direito.
A ideia de defesa à família, por sua vez, ensejava preservar valores morais e religiosos, transmitidos de geração em geração, através de pai, mãe, avó e outros antepassados.
No que tange à defesa da liberdade, ela consistia, em regra, defender os direitos, garantias fundamentais e individuais, sendo uma delas a liberdade de expressão, opinião, de culto, manifestação, a liberdade de ir e vir, etc.
Já a defesa do Estado Democrático de Direito se fundamentava na ideia de uma democracia laica, participativa, construtiva e participativa, onde o povo teria voz e políticos deveriam ser fiscalizados como todo e qualquer Servidor Público, além de ter o foco no combate a corrupção e dos privilégios.
Ocorre que a realidade é bem diferente da teoria arguida acima. O que se vê no atual jogo político e nas ruas através da militância política ou melhor “dos fã clube políticos”, haja vista a inexistência de uma militância política verdadeira e forte, consiste, sem dúvidas, num contraste da vergonha nacional, em razão de inúmeras práticas não condizentes com o que verdadeiros filósofos conservadores ensinaram no decorrer da história, bem como também do desconhecimento intelectual de uma parte da própria militância política sobre a importância das próprias pautas defendidas.
O Bolsonarismo, por exemplo, é o movimento social atual e principal que fomenta a criação desses “fã clubes políticos”, afastando a verdadeira essência do conservadorismo clássico. É uma mistura de loucura, psicopatia, fanatismo e idolatria.
Com características raivosas e com discursos esbravejantes, esse movimento rejeita todo e qualquer tipo de críticas em suas ações, pois, qualquer um que criticar, mesmo de forma sutil, é colocado numa lista negra, tratado como um inimigo, traidor ou simplesmente será identificado como “esquerdista” e “comunista”. Sem dúvidas, o meu nome deve se encontrar nessa lista, a qual terei a honra de me sentir homenageado.
Certa vez, em uma manifestação, Bolsonaristas agrediram enfermeiros que manifestavam em prol do isolamento social na Praça dos Três Poderes, em Brasília, Distrito Federal, chamando-os de “sem vergonha” e “covardes”.[1] O grupo de manifestantes apenas pediam por melhores condições de trabalho e pela manutenção do isolamento social durante a pandemia do novo Corona Vírus.
Outro fato também a ser mencionado é sobre a fala do Presidente Jair Bolsonaro, que diz que se pudesse substituiria, sem pestanejar, a Constituição pela Bíblia, além de dizer que o Estado é laico e ao mesmo tempo é cristão. Uma argumentação bastante confusa nos termos da língua portuguesa. Como um Estado pode ser laico e ao mesmo tempo cristão? Será que o Presidente Jair Bolsonaro se referiu, na verdade, de apesar do Estado ser laico, o povo é cristão? Se for essa referência, ela se encontra correta, pois, um Estado somente pode ser religioso ou laico. [2] Mas, todavia, essa fala, por sua vez, ameaça a existência de um Estado laico no Brasil e, neste sentido, é de suma relevância pensar e perguntar: Qual é o problema do Estado laico? Ele é prejudicial para a sociedade?
Um Estado laico não pode adotar uma religião oficial ou privilegiar crenças, tanto que é necessário que haja uma Constituição que garanta direitos iguais para todos os cidadãos, não importando a sua crença religiosa. Qual é o problema disso? Acaso as minorias estão incomodando as maiorias? É um novo tipo de apartheid? Ainda não se pode concluir nada sobre o tema, mas, apenas refletir.
Atualmente o Estado laico no Brasil se encontra tão ameaçado que recentemente a Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos (Atea) ajuizou uma ação na Justiça contra Bolsonaro por live com religiosos, por considerar uma transmissão religiosa em uma emissora pública de televisão violar o princípio do Estado laico previsto na Constituição Federal.[3] Segunda entidade, a utilização da emissora para atender a interesses privados do presidente e de segmentos religiosos fere, indiscutivelmente, o interesse público.
Nessa linha, pode-se interpretar que o movimento Bolsonarista defende atos antidemocráticos, pois, democracia, é um sistema onde a maioria governa, mas, tem o dever de proteger a minoria e, neste sentido, não há como vislumbrar dessa perspectiva. O Jurista Paulo Bonavides já definia democracia como um sistema no qual os cidadãos possam participar, diretamente, das decisões políticas fundamentais de um determinado Estado. Portanto, há em sua característica o direito à igualdade, algo que infelizmente não é defendido por tal movimento, que por sua vez, se define como o único e verdadeiro conservador.
Só que o Bolsonarismo esquece que antes de sua existência, o movimento conservador no Brasil já existia, originado a partir de determinadas tradições culturais do Brasil, assim como a relação com raízes culturais luso-ibéricas e influências diversas, como a influência romana e até grega em sua fundação no cristianismo, além de visões na crença no unitarismo político no catolicismo e no monarquismo.
É triste dizer, mas, infelizmente muitos pertencentes a esse movimento não entendem o que é dito nesse artigo. As maiorias não sabem o que verdadeiramente reivindicam. Prova disso é que recentemente o Arthur do Val, do canal Mamãe Falei do Youtube, participou de uma manifestação bolsonarista, com o objetivo de descobrir se eles realmente estão ou não conscientes de suas próprias reinvindicações. A conclusão é surpreendente, pois, demonstrou de fato que eles não sabiam o motivo a qual estavam no local. Acompanhe os vídeos abaixo:
Sobre tudo mencionado acima, a pergunta a ser respondida é: Como Roger Scruton, filósofo e escritor inglês, pensava a respeito do verdadeiro conservadorismo? A resposta é simples.
Ele explica que o objetivo do conservadorismo é tentar compreender a organização e a vida das sociedades para criarem o espaço necessário para que elas sejam bem-sucedidas e que seres humanos são responsáveis uns pelos outros mutualmente, devendo encontrar a responsabilidade na família e na sociedade civil. Além disso, ele menciona que a essência do conservadorismo está na liberdade dos cidadãos viverem nas cidades, criando vínculos afetivos duradouros às coisas valorosas, de modo a satisfazer valores privados, bem como construindo lares e valores profundos da existência.
Ainda, Roger Scruton defende a livre associação dos indivíduos. Para ele, a livre associação é necessária, porque os valores profundos de uma sociedade não são construídos através de imposição por alguma autoridade externa ou incutidos pelo medo, mas nascem de baixo para cima por relações de amor, de respeito, responsabilidade e cooperação social.
No Brasil, os movimentos brasileiros intitulados conservadores e que estão em ascensão não possuem as características propostas por Roger Scruton e, nessa linha, pode-se concluir que o Bolsonarismo, por exemplo, está distante de alcançar o conceito conservador proposto pelo filósofo. Portanto, pode-se afirmar da inexistência de um conservadorismo verdadeiro e sólido no Brasil.
O Bolsonarismo como movimento é algo incompreensível, louco, irracional, principalmente por ter na prática um líder político como um messias prometido, que por sua vez, é venerado como um Deus, de acordo com a tradição cristã. É como ele fosse a figura de Jesus Cristo, aclamado, adorado, irrepreensível e imaculado.
De início, o Bolsonarismo se mostrou um movimento que defendia o combate à corrupção e o fim da burocracia estatal. Contudo, após a sua ascensão ao poder, tornou-se como os outros da velha política.
Infelizmente o que era para ser uma promessa de renovação política, tornou-se uma piada internacional. O Bolsonarismo entrará para o lixo da história como um dos movimentos políticos mais irracionais que o Brasil já teve. Se porventura Roger Scruton estivesse vivo e conhecesse o Bolsonarismo e os movimentos conservadores brasileiros, sentiria náuseas, vergonha e se tornaria um opositor de todos.
REFERÊNCIAS
A verdade no conservadorismo. In: SCRUTON, Roger. Como ser um conservador. 1ª Edição. ed. Rio de Janeiro: Editora Record, 2015. cap. 10, p. 135-139.
NOTAS
[1] Bolsonaristas agridem enfermeiros que faziam protesto pelo isolamento social. Leia mais em https://www.otempo.com.br/brasil/bolsonarista-agridem-enfermeiros-que-faziam-protesto-pelo-isolamento-social-1.2332210# (Acesso em Maio de 2021).
[2] Afronta ao Estado laico. Leia mais em: https://istoe.com.br/afronta-ao-estado-laico/ (Acesso em Maio de 2021).
[3] Associação de ateus entra na Justiça contra Bolsonaro por live com religiosos. Leia mais em: https://istoe.com.br/associacao-de-ateus-entra-na-justica-contra-bolsonaro-por-live-com-religiosos/ (Acesso em Maio de 2021).
2 Comentários
Primeiro, vamos tirar dos poderes os políticos do congresso e dos esquerdopatas do STF. Daí, penso que vamos clarear a questão conservadora, consequentemente, a situação de laico ou não. Esse “personagem” do mamãe falei, ganha uma fortuna para derrubar nosso Presidente. …
Parabéns, só li o post hoje e descreve muito bem o momento. Quando essa loucura vai passar ainda não dá pra saber.