Conforme nos aproximamos do ano eleitoral (2022), a mídia, os intelectuais, os institutos e partidos políticos começam a explorar possíveis nomes para o executivo nacional, bem como fazer pesquisas de intenção de voto, com maior ou menor índice de confiança (Medida estatística usada para calcular a famosa margem de erro). Atualmente um dos tópicos de maior interesse da mídia é a possível reeleição do presidente Jair Bolsonaro. A ampla maioria das pesquisas vem indicando uma liderança numérica do atual presidente no primeiro turno e uma derrota no segundo turno para o ex-presidiário Lula. Não duvido que as pesquisas estejam corretas. Entretanto, pesquisas refletem o momento e cravar qualquer resultado hoje para uma eleição em outubro de 2022 é irresponsabilidade.
Como nem todos nós somos ambientalistas que podemos errar todas as previsões e ainda sair como bem intencionados e com a reputação intacta, eu não vou prever nenhum resultado, apenas vou trazer para o debate coisas que a opinião pública não levantou ainda.
Antes de tudo, é preciso ter em mente o roque que Jair Bolsonaro fez no ano passado. Para os que não são familiarizados, o roque é um movimento no Xadrez em que o jogador troca de posição a Torre (a terceira melhor peça ofensiva) com o Rei (peça que precisa ser defendida para não perder o jogo). Essa troca existe para proteger melhor o rei e liberar a torre para o ataque.
Durante a pandemia do COVID-19, o presidente Bolsonaro fez uma escolha com relação ao seu eleitorado, eleito em 2018 com apoio maciço das classes A,B e metade da C (Em outras palavras, da elite e da classe média e média alta).Essas classes viram em Bolsonaro e suas propostas na época, uma possível saída para a estagnação econômica e possivelmente a possibilidade de salto do Brasil de país em desenvolvimento para país desenvolvido. Além disso, também viram o presidente se voltar contra elas no momento da pandemia, afinal, se o dinheiro não é problema, a preocupação maior passa a ser com sua saúde em um momento de aguda crise sanitária. Foi nesse momento que Bolsonaro realizou o Roque, é ingênuo crer que Bolsonaro é burro como grande parte da opinião pública crê, ele pode até ser louco, mas burro não.
O discurso negacionista do presidente que custou muito da sua popularidade com as classes mais esclarecidas encontrou um eco esperado nas classes mais pobres, basta imaginar que a maioria dos empregos perdidos não foram nas classes altas capazes de funcionar, ainda que em qualidade inferior de forma remota. Os autônomos e os mais pobres sentiram o golpe de forma muito mais forte, Bolsonaro percebeu que poderia aumentar a sua representação nesse segmento da população e fez uma troca de base de apoio durante o seu mandato, para fidelizar esse eleitorado mais pobre Bolsonaro fez uso político do assistencialismo, as custas de tornar virtualmente insustentável a situação fiscal do Brasil no longo prazo, segundo dados do FMI (Fundo monetário internacional) em 2021 a razão entre a dívida e o PIB brasileiro será de 98,4% (https://static.poder360.com.br/2021/04/fiscal-monitor-fmi-7abr2021.pdf ), isso quer dizer basicamente que o Brasil ficará insolvente em um futuro próximo, o controle dos gastos públicos deveria ser a prioridade número 1 em Brasília hoje.
Com o pagamento do auxílio emergencial, Bolsonaro repôs as perdas de popularidade que o haviam atingido após o início da pandemia, especialmente no nordeste (região tradicionalmente alinhada à esquerda no Brasil). E claramente escapou de um impedimento no congresso ao usar essa força popular, ainda que artificial, para emplacar aliados na presidência da câmara e do senado.
No início de 2021, o pagamento do auxílio emergencial foi finalizado e a constatação foi de que a popularidade do presidente havia regredido novamente, além de uma CPI analisando a omissão do seu governo na compra das vacinas para o combate frente a pandemia, (CPI ilegal na origem, diga-se de passagem, por intromissão indevida do judiciário no legislativo, ainda que o objeto da investigação seja justo, as coisas precisam seguir o devido processo legal) e o STF agindo para salvar a pele de Lula. Bolsonaro se viu em uma situação difícil,em que pela primeira vez sentiu sua reeleição realmente ameaçada.
Ao estudar a importante vertente da ciência política originada na universidade de Virgínia nos Estados Unidos, chamada de Public Choice, cuja aplicação de métodos econômicos neoclássicos rendeu um Nobel de economia para James Buchanan e Gordon Tullock nos deparamos com o conceito de Political Business Cycle. Esse termo explica a situação em que o presidente ou primeiro ministro em busca da reeleição tem todos os incentivos possíveis para estimular a economia de forma a criar uma ilusão de crescimento econômico, políticas expansionistas do ponto de vista fiscal e monetário tendem a facilitar a vitória de quem busca a reeleição. Claro que após as eleições a bolha estoura, como sempre ocorreu na história da política e da economia, e ajustes com políticas fiscais e monetárias contracionistas se tornam necessárias para o controle Ex Post do resultado eleitoral.
A forma como ocorre essa manipulação do sistema pode variar bastante, redução dos impostos, ampliação dos gastos públicos seja com infraestrutura (Keynesianismo) ou assistencialismo, reduzir o preço do gás ou da energia elétrica, injeção monetária por parte do Banco Central, adoção de medidas protecionistas para reduzir o desemprego… Os instrumentos são variados e de amplo escopo.
Sendo que essa capacidade de manipulação do sistema é uma das vantagens do incumbente, outro termo que parece esquecido no debate público brasileiro, é a vantagem do incumbente que explica o porque quase nunca presidentes buscando a reeleição são derrotados, no Brasil nunca aconteceu, nos Estados Unidos 70% dos presidentes que buscaram a reeleição conseguiram desde 1948, na Alemanha nas últimas 16 vezes que houve incumbente, ocorreram 13 vitórias. Empiracamente isso significa uma correlação bem forte, ter o controle da máquina quando se disputa uma eleição é um trunfo, uma grande vantagem.
A Vantagem do incumbente e seu impacto na disputa eleitoral podem ser divididos da seguinte forma.(GIANTURCO, A. 2018 p 314)
- Controle da Máquina Pública
- Influenciar no Political Business Cycle
- Propagandas Institucionais
- Controle Informacional
Diante desse cenário, a solução encontrada pelo presidente para se tornar mais competitivo em 2022 foi semelhante a de 2020, turbinar os programas sociais ampliando em 50% o valor do Bolsa Família além de uma ampliação do pagamento em um programa que deve substituir o atual jovem aprendiz. Meu palpite é de que os números de aprovação do presidente irão subir no segundo semestre quando esses programas saírem do papel e a eleição vendida como barbada para Lula sem sombra de dúvidas será extremamente disputada.
Esse é outro ponto que os formadores de opinião convenientemente esqueceram, Se enfrentar Bolsonaro é bom para Lula, enfrentar Lula também é ótimo para Bolsonaro. Em outro termo consagrado pela Ciência Política, a janela de Overton repousa a explicação, esse conceito explica como a opinião pública reage frente aos temas que podem ser levantados em uma campanha, esses temas podem ser criminalidade, uma grave crise internacional (Em países mais relevantes na geopolítica global), Corrupção, economia, educação… Os posicionamentos dentro da janela, são levados em consideração pelos agentes públicos e privados envolvidos no ambiente político, os posicionamentos fora dessa janela, tendem a não encontrar eco e a partir disso não conseguirem juntar forças eleitorais para, por si só, vencerem as eleições. Essa é a regra, em um ambiente político dentro da normalidade, nem Lula, nem Bolsonaro teriam a projeção que tem hoje.
No entanto em situações de extrema polarização, os discursos de fora do sistema ganham notoriedade, e o consenso da janela de Overton se vê enfraquecido. Vale lembrar que tal movimento de “fúria contra o consenso” não é somente nacional, a recente eleição peruana opôs a extrema direita e a extrema esquerda, na França Marine Lê Pen (derrotada em 2017 por Emmanuel Macron) lidera as pesquisas para a eleição de 2022, com o início abaixo das expectativas do governo Biden em algumas áreas extremamente relevantes é o fantasma de Donald Trump e Bernie Sanders que volta a rondar nos Estados Unidos, na Alemanha após negativa de Merkel em buscar a reeleição, as pesquisas iniciais apontam uma vitória do Partido Verde (Extrema Esquerda).
No contexto brasileiro, é correto dizer que a maioria dos eleitores se encontra na região de consenso da janela, entretanto, no cenário atual não existe representatividade política forte o suficiente desse consenso que seja capaz de chegar ao segundo turno das eleições, claro, pode ocorrer um fenômeno parecido com que levou Bolsonaro a presidência? Pode, é improvável mas não impossível, em junho de 2017 a maioria dos analistas não cogitavam que Bolsonaro iria sequer ao segundo turno.
O grande desafio do consenso nesse momento é acomodar interesses partidários diversos em uma candidatura única, a briga pela liderança nessa chapa tende a implodir o bloco antes dele sequer existir oficialmente, o que beneficiaria em tese os dois candidatos que polarizam a extrema esquerda com a extrema direita.
Nesse cenário a eleição adquire caráter plebiscitário, e de duas uma, ou forçara um voto tático da maioria da população, Lula contará com votos de quem nunca foi petista ou lulista, e Bolsonaro contará com votos de quem nunca foi bolsonarista, ou teremos um nível gigantesco de abstenções e brancos e nulos. O sistema atual retroalimenta aos dois polos extremos como um cabo de guerra, e como a própria janela de Overton nos ensina, quando existe um deslocamento brusco para um lado ou para outro, a tendência é de reação extremada e contrária no próximo ciclo eleitoral, em certos sentidos Bolsonaro é unicamente uma resposta (ainda que desajeitada e desastrada )aos 16 anos de Lulopetismo.
2 Comentários
Infelizmente um momento triste , onde a pandemia foi utizada por políticos, imprensa, com fins políticos. Enquanto no mundo se uniram contra o vírus, no Brasil não importava vidas, mas sim derrubar o presidente.
Se Bolsonaro nos decepcionou em algo, ainda é melhor do que retroceder ao governo corrupto e imcopentente do PT.
A grande dúvida é ate onde irá o uso cheio de ilegalidades do Judiciário(STF).