Nas relações internacionais brasileiras e em sua condução da política externa nenhuma palavra foi tão utilizada ao longo dos anos quanto a palavra Pragmatismo. A palavra é utilizada desde os tempos de Getúlio Vargas para exaltar a diplomacia vacilante do Brasil que flertou com o Nazi-Fascismo no período da Segunda Guerra Mundial, passando por Santiago Dantas e sua famosa PEI (Política Externa Independente), até a Política Externa Altiva e Independente do governo militar e o período de Celso Amorim como chanceler que ficou conhecido como Política Externa Altiva e Ativa.
Para entender o porquê esse termo foi tão utilizado no país é necessário compreender que qualquer política externa que não estivesse conforme o que a intelectualidade mais à esquerda tinha como proposição, era tratada como uma política externa submissa aos interesses das grandes potências, em especial dos Estados Unidos, uma das influências do domínio anti americanista histérico na academia e na mídia nacional. Portanto, para essa parte da comunidade das relações internacionais não havia diferença alguma entre Dutra, JK, Castello Branco, FHC ou Bolsonaro. Pois todos eram capachos do “império” americano e entreguistas da soberania nacional.
Parece uma simplificação ao colocar dessa maneira, porém isso é proposital, para demonstrar o quão dependentes da ideologia é essa parcela da comunidade quando se trata de fazer análises. Além disso, se torna evidente ao observar discursos, livros e palestras dos autores ligados a essa vertente “pragmática” que usualmente rodeiam os círculos de poder do “Lulopetismo” que seu eixo de definição da política externa sempre estará associado a quem quer que seja o rival americano.
Não adianta também tentar demonstrar para eles que o “pragmatismo” deles sempre foi apenas a escolha de outra superpotência para se curvar, uma que fosse ideologicamente ligada ao que eles pensam e não uma aliança que desse alguns ganhos para o país… Lá atrás foram os Comunistas Soviéticos com Jânio Quadros condecorando Che Guevara e João Goulart quase transformando o Brasil num Estado satélite soviético, hoje são os chineses.
Também não adianta demonstrar que a China “colonizou” o Mercosul e enfraqueceu o Brasil em seu próprio quintal. O ex-embaixador Rubens Barbosa, presidente do instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior brasileiro, afirmou o seguinte.“O comércio do Brasil dentro do Mercosul despencou de 1998 a 2022. Há 25 anos o bloco representava 17% do comércio exterior brasileiro e ano passado essa fatia foi pouco mais de 6%“(Seminário O Novo Brasil 2023). O Brasil já não é mais o principal parceiro comercial nem da Argentina.
Alguém se lembra da reação dessa mesma turma quando Bolsonaro se recusou a condenar o déspota russo Vladimir Putin pela invasão ao território ucraniano no início de 2022? E a reação do mesmo grupo, quando Lula não só não condenou como passou uma vergonha histórica ao sugerir que um complexo conflito por território seria resolvido com uma “cervejinha” e aprofundou os laços com o país agressor? Bolsonaro era imoral e Lula simplesmente “pragmático”…
Os recentes eventos no conflito entre a Venezuela e Essequibo, e a guerra civil que se desenha no Equador trouxe novamente essa palavra mágica para a boca dos analistas e como a história tende a se repetir em ciclos, novamente ela é usada de maneira equivocada pelos analistas simpáticos ao governo. Porém, dessa vez a conduta diplomática de Lula surpreendeu também a Direita, que não entendeu os movimentos antagônicos a ideologia de Lula realizados pela diplomacia brasileira em meio a essas crises. No auge da crise diplomática entre Essequibo e Venezuela em dezembro. Lula sinalizou que não daria passagem para Maduro através do território brasileiro para o ditador venezuelano alcançar o território de Essequibo sem ter que invadir por mata fechada, complicando toda a logística de uma guerra.
O grande medo do PT não é uma guerra no quintal do Brasil, mas sim outros dois motivos que motivaram o “pragmatismo” de Lula. O primeiro é que o Reino Unido e os Estados Unidos ampliem sua presença militar ou construam uma base em Essequibo como dissuasão a qualquer aventura posterior de Maduro em busca de Petróleo e o segundo o fato que se Maduro eventualmente fracassar em sua empreitada, Lula seria o único de esquerda em todo o continente, com a eminente derrota de Boríc no Chile e o restante do Mercosul todo à direita Lula estaria isolado em todo o seu entorno geográfico.
Outro evento em que Lula espantou tanto a direita quanto a esquerda foi na reação tomada pelo Brasil de oferecer apoio diplomático e militar ao governo equatoriano (de direita) em sua cruzada contra o narco-tráfico nesse início de ano. O observador desatento pode não ter observado, mas o PT deu um giro considerável em sua política de segurança habitual nos primeiros governos Lula e nos governos Dilma. O governo Lula hoje fala grosso com a criminalidade, por que isso ocorreu? Aqui agradeço a precisa observação do meu sócio Eduardo Carvalho. Historicamente a esquerda brasileira sempre defendeu todas às teses neo-marxistas sobre a criminalidade, porém agora com às Milícias crescendo e rivalizando com os narcotraficantes, executando militantes e políticos de esquerda, se tornar um “punitivista” é questão de sobrevivência, ainda acrescento uma preocupação de fundo eleitoral, o caos na segurança pública talvez seja a única maneira de atacar o petismo por parte da oposição à direita.
Em resumo, tenha medo toda vez que algum político brasileiro alegar pragmatismo para sustentar suas ações em nossa política, especialmente na área da política externa, pois sempre existe algo além da mera retórica diplomática oficial.
Bibliografia.