O pacote anticrime, composto por propostas do Ministro da Justiça, Sergio Moro, e do Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, foi aprovado, sendo, por conseguinte, sancionado pelo Presidente Jair Bolsonaro e publicado no Diário Oficial da União (DOU) em 24 de Dezembro de 2019 com vetos, que, por sua vez, iniciará os seus efeitos a partir do dia 23 de Janeiro de 2020, prevendo alterações e inclusões no Código Penal, no Código de Processo Penal e na Lei de Execução Penal no que concerne embargos de declaração e recursos, no crime de caixa dois nas eleições, endurecimento das penas e solturas, saídas temporárias e progressão de pena, bem como também na legítima defesa.
Além disso, estão previstas mudanças no entendimento sobre organizações criminosas, armas de fogo, confisco de bens de origem criminosa, acordos com investigados, presídios federais, agentes disfarçados, a criação do Banco Nacional de Perfis Balísticos e do Banco Nacional Multibiométrico e de Impressões digitais.
Embora aprovação, o pacote anticrime teve um trâmite longo e desgastante, sendo desidratado pelo congresso ao longo de sua tramitação, empacotando, em sua maior parte, propostas apresentadas por Alexandre de Moraes e retirando alguns pontos, como a prisão após a condenação em segunda instância, a excludente de ilicitude para policiais, a alteração no conceito de legítima defesa e a criação do ‘plea bargain’, uma espécie de acordo com o Ministério Público para os réus confessarem seus crimes em troca de penas mais brandas.
Todavia, algumas instituições e alguns especialistas manifestaram suas insatisfações com a nova medida. A Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos, através de uma análise, concluiu que a proposta viola direitos fundamentais, legitima a letalidade policial e agride a Constituição, relativizando princípios como o da presunção de inocência, devido processo legal, ampla defesa e princípio da individualização da pena, assegurados na Constituição.
Luiz Regis Prado, professor titular de Direito Penal da Universidade Estadual do Paraná (UEM) e do programa de pós-graduação da Faculdade Autônoma de Direito (FADISP) vai além. Para ele, o pacote anticrime pode gerar retrocessos de direitos fundamentais, uma vez que viola a sistemática do Código de Processo Penal e a Lei de Execuções Penais ao criar a chamada execução “provisória” da pena a partir da condenação em 2ª Instância. “É preciso manter a sintonia com o texto constitucional de 1988 em seu artigo 5º, inciso LVII, que prescreve como cláusula pétrea: ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, concluiu.
Ainda, o Jornal o Estado de São Paulo publicou uma nota sugerindo a completa rejeição do pacote anticrime, sob a justificativa de que é um novo engano, pois, além de ser disfuncional, prometendo algo que não conseguirá realizar, o mesmo viola direitos e garantias fundamentais.
Entretanto, embora as narrativas, não é possível encontrar uma premissa que merece prosperar. Quanto a relativização, violação do princípio da presunção de inocência e direitos e garantias individuais, ela é inexistente, tendo em vista o início do cumprimento da pena após condenação em 2ª instância estar relacionada à execução provisória da pena, que, por sua vez, é cabível na pendência de recurso sem efeito suspensivo.
Ainda, a própria Constituição Federal prevê como direitos e garantias fundamentais para os presos a proibição de torturas, penas cruéis, perpétuas, bem como o respeito à integridade física e moral, o que não será violado.
Vale ressaltar que a lei de execução penal continuará priorizando em seus dispositivos a possibilidade de recuperação do detento para o convívio social dentro do sistema carcerário, determinando o Estado garantir assistência, a fim de fornecer alimentação, vestuário, instalações higiênicas, atendimento médico, farmacêutico e odontológico, bem como assistência jurídica gratuita para aqueles não possuem recursos financeiros para constituir advogado e orientação religiosa com liberdade de culto, tendo, ainda, o direito à posse de livros religiosos.
É importante frisar também que, conforme dito acima, o projeto original previa também a regulamentação da prisão em segunda instância através da lei de execuções penais, porém, o grupo de trabalho criado na Câmara com a finalidade de analisar o pacote de reformas do Ministro Sérgio Moro, retirou o tema do texto por entender ser possível trata-lo apenas por meio de Proposta de Emenda Constitucional (PEC) e, por isso, não entrará em vigor.
O recurso, como via de regra, tem efeito devolutivo, podendo em alguns casos, ter efeito suspensivo. Neste sentido, vale lembrar que o efeito suspensivo dos recursos ocorre quando há a total paralisação, mesmo que provisória, da execução de uma sentença até o seu julgamento final.
No que tange a violação do princípio da individualização da pena e ampla defesa, o pacote anticrime assegura que cada cidadão-preso responda individualmente por seus atos e que se defendam da acusação através de todos os meios legais cabíveis, porém, endurece as penas e dificulta a atuação das organizações criminosas.
Portanto, o pacote anticrime não viola direitos fundamentais do preso, haja vista as alterações e acréscimos no Código Penal, Processual Penal e lei de execuções penais visam apenas endurecer as penas. É, de alguma maneira, um mecanismo de repressão estatal, mas, embora a prerrogativa, ela não deixa de considerar a ressocialização do indivíduo durante o cumprimento da sentença penal condenatória.
REFERÊNCIAS
Análise da Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos: http://abre.ai/aBPQ – Acessado em Janeiro de 2020
Análise do Professor Luiz Regis Prado: http://abre.ai/aBPW – Acessado em Janeiro de 2020
Análise do Jornal o Estado de São Paulo: http://abre.ai/aBP0 – Acessado em Janeiro de 2020