Em comparação com as outras áreas do conhecimento político como a Filosofia e Ciência Política e social como a Economia. A área das Relações Internacionais de maneira autônoma ainda é uma ciência jovem, surgida no século XX no contexto pré primeira guerra mundial (1914-1918) para explicar devidamente os fenômenos de guerra e paz. Ao longo do século XX o campo se desenvolveu em várias vertentes e teorias associadas. Esse artigo irá tratar de 10 livros indispensáveis para o entendimento adequado da Política Internacional, seja para um analista já experiente ou para os que desejam entender mais do tópico esses livros são importantíssimos. Alguns são clássicos outros já são voltados para o entendimento dos problemas relacionados especificamente ao século XXI.
Antes de tudo algumas menções honrosas: Armas e Influência de Thomas Schelling, Porque as Nações Fracassam de Daron Acemoglu e James Robinson, Teoria Social da Política Internacional de Alexander Wendt, Além do Realismo e do Marxismo de Andrew Linklater, A Necessidade é a maior virtude de Jonathan Haslam.
1 – A Política entre ás Nações: A Luta pelo poder e pela paz ( 1948 )
Autor: Hans Morgenthau
Impossível iniciar essa lista com outra obra, Hans Morgenthau basicamente fundou o campo de estudo e forneceu os componentes básicos para o Realismo enquanto teoria política internacional, inspirado nos autores realistas da Filosofia e Ciência Política como Thomas Hobbes e Nicolau Maquiavel, coube a Morgenthau desenvolver como esses princípios realistas iriam ser adaptados para a arena internacional em que não existe hierarquia política ou jurídica. Com extensa obra e enorme relevância acadêmica na segunda metade do século XX Morgenthau é um dos mais importantes pensadores da Política Internacional. Dentre suas maiores contribuições estão o isolamento da política internacional como algo determinado pela ideologia e visão de mundo do governante. É preciso entender e ser capaz de avaliar ás capacidades materiais dos Estados e reconhecer a maldade inerente a natureza do homem. Também é contribuição dele os famosos 6 Princípios do Realismo Político:
- A política obedece leis objetivas que são fruto da natureza humana, “ Para estar em condições de melhorar a sociedade, é necessário entender previamente as leis pelas quais a sociedade se governa. Uma vez que a operação dessas leis independe, absolutamente, de nossas preferências , quaisquer homens que tentem desafiá-las terão de incorrer no risco do fracassso.
- O Interesse do Estado é sempre configurado em termos de poder, apenas isso pode permitir antecipar os passos que um político passado, presente ou futuro deu ou dará no cenário político.
- O Realismo parte do princípio que que seu conceito chave, o interesse baseado em termos de poder é universalmente válido, porém não com significado fixo nem permamente.
- O Realismo Político conhece o significado da ação moral e reconhece a inevitável tensão entre os preceitos morais e as exigências para que uma ação política tenha êxito “ Desse modo o realismo considera a prudência (avaliação das consequências decorrentes de ações políticas alternativas ) representa a virtude suprema na política.
- O Realismo político recusa-se a aceitar as aspirações morais como leis que regem o universo.
- O Realista político não ignora a existência nem a relevância de padrões de pensamento que não sejam ditados pela política, Na qualidade de realista político, contudo, ele tem de subordinar esses padrões aos de caráter político e ele se afasta das outras escolas de pensamento quando estas impõem á esfera política quaisquer padrões de pensamento apropriados a outras esferas. ( MORGENTHAU, 1948, Pp 6-22)
2- Teoria das Relações Internacionais ( 1979 )
Autor: Kenneth Waltz
Livro mais utilizado nos cursos de Relações Internacionais em todo o mundo, o legado de Waltz dentro do realismo só é superado pelo de Morgenthau e rivalizado por Mearsheimer que também estará presente nessa lista. Waltz funda a principal vertente do realismo contemporâneo, o chamado Neorrealismo Estrutural, posteriormente a vertente de Waltz ficaria conhecida como realismo defensivo enquanto a de Mearsheimer como realismo ofensivo. Dentre suas principais contribuições estão. Os três níveis de Análise para explicar o acontecimento das guerras, o primeiro está imediatamente associado a visão negativa da natureza humana sustentada por Morgenthau, o segundo está associado a visões que tratam a política externa como instrumento da política interna e não como uma área autonôma com regras próprias portanto a guerra surgiria devido a características específicas de determinados Estados, Líderes ou Diplomatas, essa visão é bem comum entre teóricos liberais e marxistas que confrontam o realismo, o terceiro nível de análise é o sistêmico e ele que explica na visão de Waltz a ocorrência de guerras, na ausência de Leis Internacionais que tenham realmente eficácia os Estados quando o tópico em questão é tão relevante para o Estado apenas impondo a força sua vontade perante o outro Estado é que ele irá atingir um resultado satisfatório.
Outras duas contribuições importantes de Waltz são a contagem de polos de poder no sistema, quanto mais polos de poder existirem mais provável a eclosão de conflitos de larga escala. Waltz também escreveu sobre o comportamento dos Estados no sistema para demonstrar como os Estados mais fracos se comportam perante os mais fortes. Ou seguindo o líder para usufruir dos benefícios relativos ( Bandwagoning ) ou se juntando com outros mais fracos para impedir uma ação agressiva da nação mais poderosa e manter o Status-Quo ( Balancing )
3- A Tragédia da Política das Grandes Potências ( 2001 )
Autor: John Mearsheimer
Principal proponente da variação do realismo estrutural que leva o nome de Realismo Ofensivo. A diferença entre a visão de Waltz e Mearsheimer está relacionada a qual o nível de segurança existente no SI ( Sistema Internacional ). Para Waltz o comportamento padrão dos Estados é o de manutenção da sua posição, por isso o nome de Realismo Defensivo. Já para Mearsheimer não existe segurança em abundância nesse mundo, portanto os Estados, em especial aqueles que são Potências precisam sempre almejar a hegemonia regional para se serem capazes de garantir sua segurança e sobrevivência. Os Estados serão agressivos e revisionistas em sua postura, visando a construção de sua hegemonia. Outras contribuições do autor estão associadas a identificação do comportamento de passagem de bastão ( Buck Passing) que os Estados utilizam ao lidar com ameaças, um exemplo disso foi a Política de apaziguamento realizada por Inglaterra e França no período pré segunda guerra mundial. Um empurrou a responsabilidade para o outro e o resultado todos já sabemos. Mearsheimer também leva o crédito por resgatar a importância da Geopolítica nas Relações Internacionais, escrevendo sobre padrões de amizade e inimizade baseado no compartilhamento de fronteiras, sobre o poder paralisante das águas, e sobre a unipolaridade do sistema, em que a superpotência utiliza de potências regionais aliadas em outras partes do mundo (Offshore Balancer) para impedir o surgimento de outras potenciais superpotências.
4- O Choque de Civilizações e a Recomposição da Ordem Mundial ( 1996 )
Autor: Samuel Huntington
No cenário de vitória americana após a queda do muro de Berlim e o fim da URSS, 90% dos analistas internacionais estavam convencidos de que não haveria mais contestação ao modelo da democracia liberal, o capitalismo, a democracia e os direitos humanos haviam triunfado sobre o comunismo. Huntington não estava tão convencido, e em artigo posteriormente transformado em livro o autor argumentou que a principal fonte de conflito no mundo pós guerra fria não seria ideológica ou econômica mas sim cultural. As diferentes pretensões expansionistas e universalistas das grandes religiões monoteístas e culturas naturalmente levariam a conflitos. Huntington foi tomado como profeta após o 11/09 e eu diria que ainda mais que isso, em trechos do livro também podemos notar o embrião da guerra cultural atual entre os Progressistas de Extrema Esquerda e os Reacionários de Extrema Direita.
5- Ordem Mundial ( 2014 )
Autor : Henry Kissinger
Maior nome vivo das Relações Internacionais contemporâneas, Kissinger têm várias obras relevantes, estudos sobre a prática diplomática em si, sobre o crescimento chinês enquanto potência que poderá rivalizar com os Estados Unidos no futuro entre vários outros tópicos, como já indiquei quatro livos especificamente sobre teoria política internacional agora minha indicação adota caráter mais histórico, em Ordem Mundial o autor nos guia por um passeio pelos grandes eventos da história da Política Internacional, começando desde os elementos pré Tratado de Westphalia ( Tido como marco do início das Relações Internacionais ), passando pela Revolução Francesa, O congresso de Viena, Primeira e Segunda Guerra Mundial e Guerra Fria. Além disso o livro mergulha em como funcionam a balança de poder regional na ásia e no oriente médio. Sempre como rigor histórico e profundidade analítica.
6-Poder e Interdepêndencia ( 1977 )
Autores: Joseph Nye e Robert Keohane
Principal obra representante do Liberalismo nas Relações Internacionais a obra é uma das mais usadas pela política externa americana, em governos democratas assim como pela Europa Ocidental. A obra propõe uma reavaliação da capacidade dos teóricos realistas como Morgenthau, Waltz e Mearsheimer em explicar de forma satisfatória os fenômenos de guerra e paz. Argumentando que enquanto realistas explicam muito bem a guerra sua teoria é falha em explicar a paz. Tirando foco das políticas de segurança e focando seus esforços nas questões econômicas Nye e Keohane constroem a hoje consagrada teoria da Interdependência, em que demonstram que a constante sofisticação e integração das cadeias de produção global impediriam que ás grandes potências entrassem em guerra diretamente umas com as outras, em razão disso alguns analistas argumentam ser impossível uma guerra entre Estados Unidos e China no século XXI pois as economias de ambos os países dependem do sucesso uma da outra. Para os liberais da Política Internacional a Cooperação que dá o tom e não o conflito.
7-A Quarta Revolução: A corrida global para reinventar o Estado ( 2014 )
Autores: John Mickletwhait e Adrian Wooldrigde
Fiquei em dúvida se iria incluir esse livro na lista por se tratar de uma obra que é mais sobre Economia Política do que sobre Política Internacional, porém a investigação detalhada e minuciosa do funcionamento do regime chinês abordado no artigo o valem sua posição aqui, os autores demonstram nas lentes da economia a origem e funcionamento de todos os modelos de Estado ao longo da história, passando pelo absolutismo, pelo liberalismo, pela social democracia e pelo neoliberalismo. Os autores argumentam de maneira bem incisiva que após a ascensão do neoliberalismo com Thatcher, Reagan e a vitória na Guerra Fria o ocidente começou a se perder em disputas internas.
O consenso de Washington começou a ter oposição interna mais do que externa, Democratas e Republicanos perderam a capacidade de cooperar, rivais ideológicos se tornaram inimigos mortais com isso o consenso que permitiu a vitória na Guerra Fria se dissipou, ambos os partidos políticos radicalizaram demais e a vítima foi a posição americana de hegemona global. Reagan, Bush, Clinton e Bush Filho foram os últimos governantes americanos com maturidade política de operar na lógica do aceitável por ambos os partidos tanto no cenário interno quanto externo. Obama e Trump foram líderes incapazes de dar uma resposta que limitasse o crescimento Chinês. A hábil mistura de Capitalismo na arena internacional e Socialismo na arena interna transformou a China na mais nova ameaça ao domínio político americano e ocidental. Os autores argumentam acertadamente que os Estados Unidos ainda tem a liderança global mas é preciso reestabelecer certas práticas já realizadas com sucesso no passado para se manter dessa maneira no longo prazo.
8-20 anos de Crise: 1919-1939 ( 1939 )
Autor: Edward Carr
Mais uma obra que não é propriamente teórica, mas sim histórica. Carr construiu a melhor análise sobre as causas da segunda guerra mundial, com foco especial no idealismo que cunhou o termo da guerra para acabar com todas as guerras em relação a primeira guerra mundial. Carr demonstra que o otimismo desmedido, a criação da Liga das Nações, e os vários tratados que proibiam legalmente a guerra não teriam validade alguma no reino do caos e da desordem que é a Política Internacional. Carr não menospreza nenhum dos elementos constitutivos do poder dos Estados, em contraste com os idealistas que menosprezam a realidade da sobrevivência e da competição. Estados sempre irão levar em conta a balança de poder e suas próprias capacidades militares, econômicas, e ideológicas mas jamais irão ser restringidos por uma legislação não vinculante.
9- Nações e Nacionalismo ( 1983 )
Autor: Ernst Gellner
O Estado é a forma dominante de fazer política no mundo, e o nacionalismo um de seus fundamentos, neste livro você entenderá o que é nacionalismo, e o motivo dele perdurar até hoje, tendo inclusive ciclos de popularidade ao longo da história. O livro também é capaz de explicar a ascensão dos políticos da “ Alt Right “ que utilizam muito do populismo para obter vitórias eleitorais. Toda ação social e por consequência toda ação política existe dentro e entre grupos sociais. O Nacionalismo historicamente é a forma de coesão social mais forte na sociedade, por vários motivos, da centralização do Estado, a necessidade manter a identidade nacional e os mitos que promovem a solidariedade em grupo.
10- Paz e Guerra entre ás Nações ( 1962 )
Autor: Raymond Aron
O clássico do autor francês é o livro mais denso presente na lista, mas não menos importante e impactante, nessa obra Aron apresenta os quatro componentes fundamentais para a compreensão das Relações Internacioanais: Teoria, Sociologia,História e Diplomacia. O exame criterioso das causas da guerra e os seus efeitos nas mais diferentes dimensões da sociedade são muito bem demonstrados. A maior contribuição de Aron foi a criação de uma nova metodologia, chamada de Sociologia Histórica. Compreendendo elementos Macropolíticos, Sociológicas e Históricas quanto elementos Micropolíticos como os regimes internos dos Estados e suas concepções ideológicas.